sexta-feira, setembro 02, 2005

Tempo devastador

“Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim,
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho,
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim”

Sophia de Mello Breyner Andresen


Uma praia deserta, ao longe aquela fortaleza no meio do mar, escondida e misteriosa que eu tão bem conheço sem nunca ter ido lá…
O mar está agitado, as ondas revoltam-se e vão desmaiar em espuma na areia molhada. Eu estou contigo numa zona da praia com plantas agrestes, a praia tem um aspecto quase selvagem. Agora não passas de uma alma, mas na altura estavas lá e existias para mim e para os outros…
Eu mostro-te um búzio que apanhei e tu, com aquela paciência que te caracterizava, escutavas com atenção o que eu te dizia, enquanto eu apertava a outra mão com o nervosismo de te mostrar a minha preciosidade.
Aqui e ali, vêem-se rochas espalhadas pela praia e pelo mar.
É um momento perfeito num ambiente onírico para o qual contribui a névoa branca causada pela espuma das ondas, que envolve a praia. Avistam-se meia dúzia de casas ao longe, mas também essas, com um aspecto inabitável
O sol está encoberto e o verde do pinhal contrasta com o branco da areia. È um tempo que não volta, parou ali, naquele momento perfeito, que eu agora recordo…
O mar parece um espelho e tu, com uma mão no bolso e a outra a segurar no búzio, fazes-me lembrar esse mar belo e poderoso... És também o búzio brilhante de tons quentes, diferente daquela praia de Inverno. Praia essa, que apesar de tudo, é uma praia bela e rara, no meio de todas as dores.
Agora, aqui, nessa mesma praia, ao observá-la sei que ela nunca mais vai ter o aspecto que tinha naquele momento…O mar agora está azul, brilhante, a fortaleza já não espreita curiosa, vê-se perfeitamente…
A areia tem uma cor diferente, já vejo bastantes casas (consequência do passar dos anos). A praia está cheia de gente cujas vozes apagam por completo o som do mar e do vento…E eu sinto-me como a gaivota, à espera do fim do dia para poder estar na “minha praia” a olhar para o mar, a conversar com ele …
Apanho outros búzios, mas sei que nunca vou encontrar outro búzio como aquele. E a tua cara, essa, nunca vou esquecer e para isso não preciso de fotografias, olho para o mar e vejo-a…
Neste momento deves estar num sítio parecido com o que eu recordo, ou se calhar aquele momento eternizou-se e tu ainda estás lá…





1 Comentários:

Blogger Cristiana disse...

É verdade que o tempo consegue apagar muito da nossa memória. Mas existem sempre momentos, pedaços de história da nossa vida que jamais serão esquecidos. Esses residem na nossa memória e constituem as mais belas recordações.
As recordações jamais serão reais. Permanece, enfim, a certeza de que existiram e nada nem ninguém será capaz de as levar de nós.
Que essa praia exista sempre na tua vida, espaço onde possas recordar momentos que jamais virão... Almas que vivem eternamente no teu coração.

11 setembro, 2005 15:28  

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial